quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Vegetarianos x Onívoros?

Tem-se apresentado, de forma regular e constante, a proposição de que há sempre dois lados em um debate sobre vegetarianismo, os vegetarianos de um lado e os onívoros de outro.
No entanto, percebe-se neste caso, mais um exemplo do dito desconexo, conforme descrito por Tom Regan (ver Jaulas Vazias).
Dito desconexo ocorre quando o que se fala, quando a terminologia usada para descrever um objeto ou uma prática, simplesmente não condiz com o significado normal da palavra, aquele significado que é compreendido pelo senso comum e consta dos dicionários.
Para entender o motivo deste dito disconexo é necessário primeiro entender o que se está em jogo. Não é a opção de dieta o que se discute neste caso. A questão primordial é, e continuará sendo, de um lado, a defesa dos direitos animais, e de outro, a exploração dos animais.
Portanto, neste debate não há dois lados, e sim três perfis de participantes.
De um lado temos os defensores dos direitos animais que adotam, por razões óbvias, a dieta vegetariana. Me refiro ao vegetarianismo estrito ou veganismo, naturalmente. Como Tom Regan, vou chamá-los, por ora, de DDAs (defensores dos direitos dos animais).
De outro lado há os que apoiam a continuação da exploração animal e se posicionam contra os defensores dos direitos animais. Neste caso, o posicionamento destes se dá em função do posicionamento dos defensores dos direitos animais. Isto se dá porque a defesa dos direitos animais afeta interesses pessoais e corporativos deste grupo. Trata-se de um mecanismo de defesa de seus interesses. Assim, vou chamá-los por ora de anti-DDAs.
Há ainda aqueles cuja percepção em relação ao direito dos animais está em formação, que aqui chamo de neutros. Entre estes há desde os que consomem de forma irrestrita produtos de origem animal e não se envolvem minimamente na proteção animal até os que, em algum grau, se identificam com a causa animal e, eventualmente, adotam hábitos de consumo parcialmente restritivos, incluindo-se nisto a dieta, como é o caso dos ovo-lacto-vegetarianos ou daqueles que não usam roupas feitas de peles. Outro exemplo é o de pessoas que são contra os rodeios ou que militam na proteção de gatos e cachorros, embora tenha dieta irrestrita. O traço comum que une os neutros é que, embora ainda não haja um amadurecimento em relação ao entendimento dos direitos animais, há sempre algum nível de empatia em relação às demais espécies.
Assim, para nos referirmos aos defensores dos direitos animais habitualmente usamos a palavra vegetariano. Até aí nada de mais.
O problema, a meu ver, está em aceitar o termo onívoro para designar todos os outros.
Isto porque, em primeiro lugar, onívorismo é uma característica de nossa espécie. Vegetarianos são onívoros também. Lembremos que vegetarianismo é opção de consciência e não metamorfose para o herbivorísmo. Além de incorreta, a adoção do termo onívoro neste caso reforça o esteriótipo de que vegetarianos é que são diferentes, o que por si só, desobriga a todos os outros de se comprometerem com esta ‘diferença’. Ainda, isto coloca o debate no nível do respeito às diferenças e o desloca de seu local de origem, o respeito ao direito dos animais.
Outro problema é que o termo onivorísmo acaba por englobar a maior parte dos neutros, criando-se a falsa percepção de que a posição dos anti-DDAs é o senso comum.
Associado a isto, há o deslocamento de neutros que adotam a dieta vegetariana em algum grau para o campo do DDAs, o que cria um grupo de pseudo-moderados, reforçando o esteriótipo de extremistas, criado pelos anti-DDAs, para os DDAs de fato.
Assim, considerando-se que os os DDAs são habitualmente chamados de vegetarianos (vegs) proponho que passemos a nomear explicitamente os outros grupos por neutros e antivegs.
O termo antiveg tem a finalidade de reposicionar o debate para seu devido lugar, a discussão dos direitos animais, e assim evitar a principal estratégia dos antivegs que é manipular a percepção dos neutros em relação aos fatos e dos próprios DDAs em relação a quem são, de fato, os opositores, e desarticular a hostilidade criada por esta falsa separação entre neutros e vegs, já que neutros e vegs estão mais próximo em termos de valores do que os neutros e antivegs.